segunda-feira, 8 de abril de 2013

Pontes, molas, corações e emoções



Colegas de todos os estados e de todos os estados de saúde.

Sabem aqueles dias em que parece que a bruxa está solta? Pois foi o que aconteceu lá em casa nas últimas semanas. Desde a última edição das Saudações Caetés, enquanto minha esposa fazia um cateterismo e em seguida uma angioplastia com a colocação de dois stents no coração, eu tive a experiência de conviver com uma pneumonia que me deixou quebrado que nem arroz de terceira. De imediato, quero deixar claro que estamos bem e eu já retornei ao meu trabalho normalmente.

Nos dias em que Eliane estava internada veio à minha memória um personagem que conheci há uns anos atrás em situação semelhante. Meu cunhado, seguindo uma tradição familiar, foi submetido a uma cirurgia de ponte de safena e nós o acompanhamos tentando prestar alguma assistência. Durante sua convalescença dividiu o quarto com um senhor, também com problemas cardíacos. Naquelas circunstâncias fomos puxando conversa uns com os outros e eu soube que o cidadão morava na cidade de Delmiro Gouveia, lá no sertão alagoano. Quando perguntei seu nome tive uma surpresa, pois eu já tinha ouvido falar dele por intermédio dos meus pais e Eliane já tinha trabalhado com um filho dele. Disse-lhe de quem eu era filho e ele imediatamente lembrou-se de meu pai, perguntou por ele e, a partir daí, a conversa passou a rolar solta.

Encontros como este são muito raros nas grandes cidades e, para algumas pessoas, isso é coisa de "província", empregando este termo para desqualificar os lugares onde isso acontece como se fosse um palavrão. No entanto, eu gosto muito desses encontros casuais. Naquela circunstância achei muito bom saber que tínhamos que compartilhar o espaço com pessoas que já eram conhecidas.

Seu Cantuária estava internado porque estava com a pressão arterial muito alta, se não me falha a memória sua pressão era 23 por 16. Eram valores tão altos que assombrava a todos nós, menos a ele próprio que não dava a mínima para o que estava acontecendo. Conversa vai, conversa vem, ele olhou para meu cunhado, disse que já tinha feito cirurgia semelhante e de forma muito despreocupada começou a contar como tinha sido a sua recuperação:

 - Eu já fiz essa mesma cirurgia que ele fez. Num se preocupe não que é besteira. Quando eu recebi alta do hospital o médico disse que eu não poderia dirigir e um filho meu foi me levar de carro até Delmiro, mas quando a gente chegou em Arapiraca eu peguei uma briga com ele, tomei a direção do carro e fui dirigindo eu mesmo. Com uma semana, mais ou menos, após minha chegada encontrei um primo meu, o "Urêia".

"Urêia" era serralheiro na cidade de Delmiro Gouveia e, nos tempos em que eu morava nas terras paulafonsinas o conheci como cliente da loja de meu pai, onde ele ia comprar materiais para a sua serralharia. Quando eu falei que conhecia o seu primo, Seu Cantuária se animou mais ainda com a conversa e então continuou:

 - Eu ia passando de moto quando "Urêia" me chamou.

 - Eita Cantuária! Domingo eu vou fazer uma buchada lá em casa e queria lhe convidar, mas você tá desse jeito... num vai poder ir.

 - O que? Num vou poder? Fique sabendo que eu vou sim e tem mais, vou comer da buchada sim sinhô. Eu sou homem pra perder uma buchada?

Apesar da preocupação com meu cunhado que estava com o peito todo costurado de um lado, eu não consegui deixar de rir com o relato desdenhoso de Seu Cantuária. Continuando sua história ele disse:

 - Com uns quinze dias que eu voltei a Delmiro eu tava era trabalhando que num sou homem de ficar parado.

 - O que o senhor faz? Perguntei.

 - Eu conserto caminhão.

Lá para as tantas eu perguntei por que ele estava internado novamente. Na minha pobre inocência, pensei que poderia levá-lo a refletir sobre a forma como conduzia sua própria vida.

 - Tô aqui por que meus filhos me trouxeram. Minha pressão tava alta, aí eu fui no médico e ele examinou. Perguntou um bocado de coisa, aí eu disse pra ele que deve ter sido porque eu tomei rum... Eu gosto mesmo é de tomar cachaça, mas, um dia desses, eu tomei rum e acho que foi isso me fez mal. Aí o médico perguntou se eu tinha tomado uma dose, aí eu disse pra ele que nada, eu tomei a garrafa quase toda, só sobrou tantinho assim.

Concluiu a narrativa gesticulando com a mão e, mostrando o polegar e o indicador, sugeriu o volume de bebida que ficara no fundo da garrafa.

De lá para cá meu cunhado recebeu alta e voltou às suas atividades normais. Quanto a Seu Cantuária, nunca mais tive notícias dele, mas de uma coisa eu tenho certeza, onde quer que ele esteja seu espontâneo será sempre sua marca registrada.

Caros colegas, por entender que pontes e molas são coisas boas somente na área da engenharia, desejo que todos reservem seus corações apenas para as boas emoções. Uma boa semana para todos.

Saúde, luz e paz

Virgílio Agra.


(Escrito em 23/02/2011)

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