quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Sorvete para enrolar a língua



Colegas de todas as datas

Há exatamente um ano, quando estávamos nesse momento de transição ano novo versus ano velho, tive o prazer de receber em minha casa uma jovem mexicana que visitava este grande país graças a um programa de intercâmbio cultural para jovens estudantes.

Andrea Rioseco Sanjuan, natural da cidade de Mazatlan, na beira do Oceano Pacífico, estava hospedada na casa de minha irmã Márcia, lá na capital pernambucana, enquanto uma sobrinha minha visitava as terras do Tio Sam. Durante o período de natal e réveillon, aproveitando as férias escolares, a garota nos agraciou com sua presença na nossa casa numa experiência que foi, sem dúvida nenhuma, enriquecedora e bastante agradável.

Durante sua estada em terras caetés tivemos oportunidade de conversar bastante sobre os mais variados temas como comidas, vestimentas, família, estudo, etcetera e coisa e tal. Nessa época do ano, lá no hemisfério norte é inverno, e é com frio e neve que se comemora o natal e a festa de ano novo. A influência do ambiente sobre a cultura de um povo é tal, que Andrea revelou nunca imaginar que as pessoas comemorassem o natal e o ano novo sem que houvesse neve. No réveillon de 2010, ela teve a experiência de participar pela primeira vez de uma festa de passagem de ano vestida de branco e vendo os fogos de artifício com os pés na areia de uma praia de águas mornas, no nosso jeito tropical de saudar o ano que se inicia.

No período em que a jovem mexicana esteve em nossa casa, tive oportunidade de conversar com seus pais através da grande rede e, arranhando meu "portunhol", disse que Andrea, ao sair da nossa casa, deixaria saudade. Qual não foi minha surpresa quando ela teve que explicar aos seus pais o significado de palavra tão significativa para nós: SAUDADE. Neste dia, soube que esta palavrinha só existia no português e que não havia substantivo equivalente nos demais idiomas. Fugindo a esta regra, descobri posteriormente que a palavra saudade também é encontrada no galego, um dialeto usado na região da Galícia, na Espanha, exatamente na fronteira norte do país de Camões.

Hoje, Andrea está de volta ao seu país de origem e na comemoração do seu natal, apesar do clima frio devido ao inverno, tem sua boca aquecida pela comida apimentada, enquanto sua presença aquece o coração da sua família. Enquanto isso, cá no hemisfério sul, uma família caeté passou os festejos de fim de ano dividida, pois chegou nossa vez de ter uma filha realizando intercâmbio em terras estrangeiras. Morando desde julho nos Países Baixos, Janaína, nossa filha mais velha, usufrui hoje não apenas da oportunidade de conhecer as quatro estações do ano, comer queijos fabricados com técnicas seculares e visitar moinhos de vento, mas, acima de tudo, tem se enriquecido graças ao contato com outras culturas bem como com o convívio com uma simpática família holandesa. Da mesma maneira, acredito que esteja proporcionando às pessoas com quem interage uma percepção positiva sobre o seu caráter como também sobre o seu país.

No mês de dezembro, enquanto passávamos o natal nas terras paulafonsinas com os demais membros da nossa família, Janaína cantava "Jingle Bells" nas frias terras de Van Gogh. Não satisfeita com o frio batavo, resolveu, juntamente com outras colegas brasileiras, passar o réveillon na cidade de Praga na república Tcheca e, enquanto em terras caetés estávamos vendo os fogos de artifício, vestidos de branco, com os pés na areia da praia e os termômetros marcando 25º C, na terra de São João Nepomuceno os termômetros marcavam -20º C.

Como diríamos no sertão: "Eiiiita frio da gota serena!"

A temperatura era tão baixa que o batom de uma das garotas congelou dentro da bolsa e faltou bem pouquinho para que as meninas também virassem picolé. Falando nisso, vocês sabem como se escreve a palavra "sorvete" em tcheco? Ganha um sorvete de duas bolas quem adivinhar. Em tcheco a sobremesa mais popular do mundo se escreve ZMRZLINA.  Dá para acreditar? A pronúncia é tão complicada que eu fico sem saber o que é mais difícil: dizer essa palavra ou aguentar o frio de lá. Porém, do jeito que a pronúncia é complicada, eu tenho a impressão que lá para aquelas bandas o sujeito que tem menos de dez anos de idade não sabe pedir esse produto.

Colegas de longas e de todas as datas, gostaria de desejar a todos vocês que, no ano que temos pela frente, tenham saúde para enfrentar com vigor os obstáculos da vida que surgem a cada dia, a luz da sabedoria para poder distinguir o bem do mal e, finalmente, o prazer da paz de espírito. A Janaína desejo um inverno com neve e frio ameno, campos floridos, uma praia no verão, paisagens de tirar o fôlego no outono e um maçarico para poder tomar ZMRZLINA. Para mim só peço forças para aguentar o peso da palavra saudade.

Saúde, luz e paz

Virgílio Agra.

(escrito em 06/01/2011)


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