Colegas
de todas as línguas
Se você está lendo este texto pode até pensar que é alfabetizado, mas tenha cuidado, pois tudo é relativo.
Durante minhas férias pude realizar um velho sonho, conhecer a Europa. Após uma viagem de doze horas, incluindo uma conexão em Lisboa, eu, minha esposa e minha filha caçula chegamos a Amsterdã. A lentidão no desembarque do avião e a demora na restituição de bagagem foi para mim uma coisa normal, nada que eu não houvera vivenciado em outros aeroportos. Uma vez conferida toda bagagem dirigimo-nos à estação ferroviária que é integrada ao aeroporto. No percurso seguíamos as indicações das placas já que todas elas tinham a tradução para o inglês, mas quando chegamos à estação ferroviária todos os meus conceitos caíram por terra. Também não era para menos, afinal de contas, para todo lado que eu me virava, só via placas escritas em holandês, cheias de consoantes, e eu não fazia a menor idéia do que aquelas palavras significavam. Naquele momento eu me senti como um imigrante nordestino que chegava a São Paulo nos meados do século passado, um verdadeiro analfabeto. Uma vez percebendo que não iríamos entender mesmo aquela escrita, passamos a olhar em redor, até que finalmente identificamos uma bilheteria e aí os pensamentos começaram a entrar em ordem. Deixei as meninas com as bagagens fui até o guichê e, dirigindo-me à atendente, declamei uma frase pré-ensaiada:
- Good morning. Please, three tickets to this station - e deslizei sobre o balcão um papelzinho com a palavra: HEEMSTEDE - AERDENHOUT.
Eu dou um euro que sobrou da viagem para o cabra que conseguir pronunciar o nome dessa estação. A Holanda é um país lindo e com organização exemplar, mas a língua é impronunciável.
De posse das passagens, procuramos a plataforma de embarque e, após alguns minutos decifrando o quadro de horário dos trens, conseguimos embarcar sabendo que teríamos que fazer uma baldeação na estação de SLOTERDIJK, esta é fácil, pronuncia-se "sloterdaik". Finalmente, chegamos à estação de destino onde tínhamos que pegar um ônibus até o local da nossa hospedagem. Embarcamos no ônibus da Linha 80 e, dirigindo-me ao motorista, recitei aquela famosa frase:
- Good morning. Please, three tickets to this bus stop - e mostrei um papelzinho com a palavra: SHOUWTJESBRUG. (A oferta do euro que sobrou continua de pé).
Quem já passou pela experiência de chacoalhar nos ônibus urbanos aqui no Brasil não vai acreditar, pois eis que, no país dos moinhos de vento, em cada parada há um quadro constando os horários em que os ônibus passam pontualmente e, dentro dos veículos, tem um painel onde aparece o nome e horário da parada seguinte bem como das próximas três. Finalmente chegamos ao Bed & Breakfast: My Dream. A proprietária, Leonice, uma brasileira casada com Hennes, um alemão criado na Holanda, hospeda profissionalmente turistas do mundo inteiro, mas o tratamento que nos dispensou fez-nos sentir como se estivéssemos na casa de um parente muito querido.
Quem lê sobre a Holanda sabe que o país tem um histórico de tolerância com questões ligadas a sexo e drogas, mas fiquei admirado quando li num cartaz instalado no ponto de ônibus em frente da casa da Léo o anúncio: "Nu gratis". Eu concordo com a parte da tolerância, mas nudez gratuita pareceu-me um pouco exagerado. Para minha tranquilidade, Léo me explicou que se tratava de uma oferta comercial e que a palavra NU significava, em português, "agora".
Na tarde daquela sexta-feira e no dia seguinte, com o apoio de Leonice e de um casal amigo, Alaíde e Peter, conhecemos Haarlem, cidade onde estávamos hospedados, bem como outros municípios das suas redondezas. Foi num desses passeios que encontramos e pudemos visitar um moinho de vento em plena operação, destinado a produção de farinha de trigo. Do ponto de vista turístico a visita ao moinho foi encantadora, mas do meu ponto de vista como engenheiro e aficionado pelo estudo da história foi simplesmente fantástico. Entrar naquele moinho e percorrer o seu interior, ver as suas engrenagens, sua estrutura, os materiais de que ele é feito, seus mecanismos de manobra e dispositivos de segurança gerou uma quantidade enorme de informações.
No domingo fomos a Amsterdã onde contamos com o apoio de um amigo de minha filha mais velha que, apesar de estar naquela época morando na Holanda, estava, exatamente naqueles dias, em terras portuguesas com certeza. O rapaz, mineiro de nascimento e trabalhador ilegal por ousadia, nos levou ao RIJKSMUSEUM, pelo nome vocês já sabem do que se trata, onde pudemos não apenas conhecer o acervo que retrata a história da idade de ouro dos Países Baixos, como também pudemos nos deliciar com os belíssimos quadros de Rembrandt. Após o almoço, no qual comemos costelas de porco com batata (Bom demais!), fomos caminhar pelas ruas da velha cidade.
Que na Holanda tem mais bicicleta do que gente, isso todo mundo sabe, mas o que chamou a atenção deste caeté foi observar as prioridades dos batavos na hora de tratar os fluxos de tráfego nas suas cidades. Todas as vias são acessíveis às pessoas e bicicletas, sendo que essas últimas têm prioridade sobre os pedestres. Conforme nos aproximávamos do centro da cidade, gradativamente, fomos observando que o acesso de carros de passeio ia ficando cada vez mais restrito, até que chegamos num perímetro onde os únicos veículos motorizados eram os ônibus e os bondes que lá são chamados de TRAM. Outra coisa que me chamou a atenção foi ver nas ruas uma grande quantidade de carros de marcas famosas que aqui no Brasil são acessíveis aos muito ricos, mas confesso que achei simplesmente fantástico ver os motoristas conduzindo seus veículos possantes de maneira serena sem o exibicionismo tão frequentemente visto nas ruas das cidades do nosso grande país.
Caminhando pelas ruas de Amsterdã, nosso "guia por um dia", Guilherme, perguntou se poderia nos levar ao Bairro da Luz Vermelha, uma área da cidade onde a prostituição de homens e mulheres é praticada de forma regulamentada pelas leis holandesas. Diante da nossa concordância, entramos no bairro através da BLOEDSTRAAT (Rua de Sangue), local onde no passado houve uma matança de vários travestis. O relógio indicava que já era noite, mas considerando que o país gozava de horário de verão e ainda por cima fica próximo ao círculo polar, o sol ainda estava alto e iluminava muito bem toda a cidade. Talvez por conta da luz do sol nós vimos apenas um prostíbulo em funcionamento. Seguindo o costume do lugar, a casa possuía vitrines onde, em cada uma delas uma bela garota de biquíni ficava à vista dos passantes. Vindo de um país onde os trajes de banho costumam ser minúsculos, devo admitir que as prostitutas usavam biquínis bem comportados, mas uma coisa é certa, lá "nu" pode ser grátis, mas uma semi-nua não.
Por sugestão de Leonice, resolvemos incluir na nossa programação uma visita à Delft, cidade com quase mil anos de existência e bastante conhecida por sua famosa porcelana azul. A cidade tem como maiores atrativos duas grandes igrejas construídas em estilo gótico que, como outras na Holanda, foram convertidas em templos protestantes. Numa delas, a Nieuwe Kerk, por tradição, são enterrados os membros da família real holandesa. Neste templo que abriga o mausoléu a Guilherme de Orange composto, entre outras coisas, por uma estátua do grande herói nacional, pudemos observar os nichos que abrigavam as imagens de santos que foram simplesmente derrubadas e destruídas durante a Reforma Protestante na Idade Média. Outra curiosidade por nós observada foi o fato destes templos terem sido os únicos em toda a viagem em que tivemos que pagar para visitá-los.
Nesses deslocamentos entre as cidades vi algumas coisas que não pude deixar de admirar. As cidades holandesas são ligadas não apenas por ferrovias e rodovias, como também pelas ciclovias. Lá, você pode percorrer o país inteiro de bicicleta sem precisar disputar espaço com os automóveis. Além disso, até as estradas vicinais são asfaltadas. Mas o que eu mais gostava de admirar eram as fazendas holandesas. O terreno era bem plano e as divisões das áreas ao invés de serem feitas com cercas eram feitas com canais, de maneira que a terra ficava toda quadriculada. O verde cobria tudo, emoldurado pelos inúmeros canais e algumas vezes a gente via pequenas áreas de bosques. Mas surpresa eu tive quando passamos numa fazenda e eu vi umas coisas que pareciam uns rolos de papel higiênico gigantes. Eu tomei foi um susto, considerando o zelo que os holandeses têm pelas suas vaquinhas e que no idioma local vaca pronuncia-se "cu", eu pensei logo: aquilo deve servir para deixar as bichinhas bem limpinhas, para não estragar o gosto do leite. Chegando mais perto pude observar que na verdade eram rolos de feno, cobertos com uma lona apropriada de cor branca. A propósito, vaca em holandês escreve-se KOE, mas a pronuncia é daquele jeito, vocês sabem qual.
Escolher a Holanda como nossa porta de entrada para a Europa foi uma decisão acertada. Poder apreciar a riqueza do seu acervo cultural, a beleza das suas edificações, usufruir do seu transporte público, transitar pelas suas ruas e canais, conhecer suas cidades históricas e sua moderna infra-estrutura nos trás uma gama imensa de percepções que palavras são insuficientes para descrever e apenas o contato direto pode proporcionar. Da mesma maneira que os elementos físicos, a educação dos neerlandeses também nos proporcionou experiências interessantes. Durante nossa visita a Amsterdã, paramos na beira de um canal para comer um lanche quando, de repente, se aproximou de nós um homem mal trajado, com a cara de quem tinha tomado uns goles. A bem da verdade, sua aparência não correspondia ao modelo de alguém muito ajustado à sociedade. Se fosse aqui no Brasil qualquer um pensaria que ele iria pedir dinheiro ou iria ficar conversando besteiras, mas não foi o que se sucedeu. O sujeito havia encontrado próximo de onde estávamos um isqueiro velho, largado no chão. O homem pegou o isqueiro e foi perguntando a todas as pessoas que estavam naquele lugar se alguém era dono daquele objeto. Somente após se certificar que este não pertencia a nenhum dos presentes, anunciou então, em voz alta, que iria ficar com ele. Só então, botou o isqueiro no bolso e foi embora.
Pode parecer coincidência, mas desde que era menino, eu sonhava em conhecer a Holanda. Um pouco por conta de um antepassado, mas principalmente por causa da figura da Irmã Letícia, diretora e fundadora da minha primeira escola. Contar os eventos pitorescos dessa visita é apenas o jeito deste simples caeté compartilhar com vocês a maravilhosa experiência que tive oportunidade de usufruir. Aproveitando a oportunidade, gostaria de desejar a todos uma ótima semana e prometo no próximo contato continuar contando as aventuras de um caeté nas terras de além mar.
Saúde, luz e paz
Virgílio Agra
Se você está lendo este texto pode até pensar que é alfabetizado, mas tenha cuidado, pois tudo é relativo.
Durante minhas férias pude realizar um velho sonho, conhecer a Europa. Após uma viagem de doze horas, incluindo uma conexão em Lisboa, eu, minha esposa e minha filha caçula chegamos a Amsterdã. A lentidão no desembarque do avião e a demora na restituição de bagagem foi para mim uma coisa normal, nada que eu não houvera vivenciado em outros aeroportos. Uma vez conferida toda bagagem dirigimo-nos à estação ferroviária que é integrada ao aeroporto. No percurso seguíamos as indicações das placas já que todas elas tinham a tradução para o inglês, mas quando chegamos à estação ferroviária todos os meus conceitos caíram por terra. Também não era para menos, afinal de contas, para todo lado que eu me virava, só via placas escritas em holandês, cheias de consoantes, e eu não fazia a menor idéia do que aquelas palavras significavam. Naquele momento eu me senti como um imigrante nordestino que chegava a São Paulo nos meados do século passado, um verdadeiro analfabeto. Uma vez percebendo que não iríamos entender mesmo aquela escrita, passamos a olhar em redor, até que finalmente identificamos uma bilheteria e aí os pensamentos começaram a entrar em ordem. Deixei as meninas com as bagagens fui até o guichê e, dirigindo-me à atendente, declamei uma frase pré-ensaiada:
- Good morning. Please, three tickets to this station - e deslizei sobre o balcão um papelzinho com a palavra: HEEMSTEDE - AERDENHOUT.
Eu dou um euro que sobrou da viagem para o cabra que conseguir pronunciar o nome dessa estação. A Holanda é um país lindo e com organização exemplar, mas a língua é impronunciável.
De posse das passagens, procuramos a plataforma de embarque e, após alguns minutos decifrando o quadro de horário dos trens, conseguimos embarcar sabendo que teríamos que fazer uma baldeação na estação de SLOTERDIJK, esta é fácil, pronuncia-se "sloterdaik". Finalmente, chegamos à estação de destino onde tínhamos que pegar um ônibus até o local da nossa hospedagem. Embarcamos no ônibus da Linha 80 e, dirigindo-me ao motorista, recitei aquela famosa frase:
- Good morning. Please, three tickets to this bus stop - e mostrei um papelzinho com a palavra: SHOUWTJESBRUG. (A oferta do euro que sobrou continua de pé).
Quem já passou pela experiência de chacoalhar nos ônibus urbanos aqui no Brasil não vai acreditar, pois eis que, no país dos moinhos de vento, em cada parada há um quadro constando os horários em que os ônibus passam pontualmente e, dentro dos veículos, tem um painel onde aparece o nome e horário da parada seguinte bem como das próximas três. Finalmente chegamos ao Bed & Breakfast: My Dream. A proprietária, Leonice, uma brasileira casada com Hennes, um alemão criado na Holanda, hospeda profissionalmente turistas do mundo inteiro, mas o tratamento que nos dispensou fez-nos sentir como se estivéssemos na casa de um parente muito querido.
Quem lê sobre a Holanda sabe que o país tem um histórico de tolerância com questões ligadas a sexo e drogas, mas fiquei admirado quando li num cartaz instalado no ponto de ônibus em frente da casa da Léo o anúncio: "Nu gratis". Eu concordo com a parte da tolerância, mas nudez gratuita pareceu-me um pouco exagerado. Para minha tranquilidade, Léo me explicou que se tratava de uma oferta comercial e que a palavra NU significava, em português, "agora".
Na tarde daquela sexta-feira e no dia seguinte, com o apoio de Leonice e de um casal amigo, Alaíde e Peter, conhecemos Haarlem, cidade onde estávamos hospedados, bem como outros municípios das suas redondezas. Foi num desses passeios que encontramos e pudemos visitar um moinho de vento em plena operação, destinado a produção de farinha de trigo. Do ponto de vista turístico a visita ao moinho foi encantadora, mas do meu ponto de vista como engenheiro e aficionado pelo estudo da história foi simplesmente fantástico. Entrar naquele moinho e percorrer o seu interior, ver as suas engrenagens, sua estrutura, os materiais de que ele é feito, seus mecanismos de manobra e dispositivos de segurança gerou uma quantidade enorme de informações.
No domingo fomos a Amsterdã onde contamos com o apoio de um amigo de minha filha mais velha que, apesar de estar naquela época morando na Holanda, estava, exatamente naqueles dias, em terras portuguesas com certeza. O rapaz, mineiro de nascimento e trabalhador ilegal por ousadia, nos levou ao RIJKSMUSEUM, pelo nome vocês já sabem do que se trata, onde pudemos não apenas conhecer o acervo que retrata a história da idade de ouro dos Países Baixos, como também pudemos nos deliciar com os belíssimos quadros de Rembrandt. Após o almoço, no qual comemos costelas de porco com batata (Bom demais!), fomos caminhar pelas ruas da velha cidade.
Que na Holanda tem mais bicicleta do que gente, isso todo mundo sabe, mas o que chamou a atenção deste caeté foi observar as prioridades dos batavos na hora de tratar os fluxos de tráfego nas suas cidades. Todas as vias são acessíveis às pessoas e bicicletas, sendo que essas últimas têm prioridade sobre os pedestres. Conforme nos aproximávamos do centro da cidade, gradativamente, fomos observando que o acesso de carros de passeio ia ficando cada vez mais restrito, até que chegamos num perímetro onde os únicos veículos motorizados eram os ônibus e os bondes que lá são chamados de TRAM. Outra coisa que me chamou a atenção foi ver nas ruas uma grande quantidade de carros de marcas famosas que aqui no Brasil são acessíveis aos muito ricos, mas confesso que achei simplesmente fantástico ver os motoristas conduzindo seus veículos possantes de maneira serena sem o exibicionismo tão frequentemente visto nas ruas das cidades do nosso grande país.
Caminhando pelas ruas de Amsterdã, nosso "guia por um dia", Guilherme, perguntou se poderia nos levar ao Bairro da Luz Vermelha, uma área da cidade onde a prostituição de homens e mulheres é praticada de forma regulamentada pelas leis holandesas. Diante da nossa concordância, entramos no bairro através da BLOEDSTRAAT (Rua de Sangue), local onde no passado houve uma matança de vários travestis. O relógio indicava que já era noite, mas considerando que o país gozava de horário de verão e ainda por cima fica próximo ao círculo polar, o sol ainda estava alto e iluminava muito bem toda a cidade. Talvez por conta da luz do sol nós vimos apenas um prostíbulo em funcionamento. Seguindo o costume do lugar, a casa possuía vitrines onde, em cada uma delas uma bela garota de biquíni ficava à vista dos passantes. Vindo de um país onde os trajes de banho costumam ser minúsculos, devo admitir que as prostitutas usavam biquínis bem comportados, mas uma coisa é certa, lá "nu" pode ser grátis, mas uma semi-nua não.
Por sugestão de Leonice, resolvemos incluir na nossa programação uma visita à Delft, cidade com quase mil anos de existência e bastante conhecida por sua famosa porcelana azul. A cidade tem como maiores atrativos duas grandes igrejas construídas em estilo gótico que, como outras na Holanda, foram convertidas em templos protestantes. Numa delas, a Nieuwe Kerk, por tradição, são enterrados os membros da família real holandesa. Neste templo que abriga o mausoléu a Guilherme de Orange composto, entre outras coisas, por uma estátua do grande herói nacional, pudemos observar os nichos que abrigavam as imagens de santos que foram simplesmente derrubadas e destruídas durante a Reforma Protestante na Idade Média. Outra curiosidade por nós observada foi o fato destes templos terem sido os únicos em toda a viagem em que tivemos que pagar para visitá-los.
Nesses deslocamentos entre as cidades vi algumas coisas que não pude deixar de admirar. As cidades holandesas são ligadas não apenas por ferrovias e rodovias, como também pelas ciclovias. Lá, você pode percorrer o país inteiro de bicicleta sem precisar disputar espaço com os automóveis. Além disso, até as estradas vicinais são asfaltadas. Mas o que eu mais gostava de admirar eram as fazendas holandesas. O terreno era bem plano e as divisões das áreas ao invés de serem feitas com cercas eram feitas com canais, de maneira que a terra ficava toda quadriculada. O verde cobria tudo, emoldurado pelos inúmeros canais e algumas vezes a gente via pequenas áreas de bosques. Mas surpresa eu tive quando passamos numa fazenda e eu vi umas coisas que pareciam uns rolos de papel higiênico gigantes. Eu tomei foi um susto, considerando o zelo que os holandeses têm pelas suas vaquinhas e que no idioma local vaca pronuncia-se "cu", eu pensei logo: aquilo deve servir para deixar as bichinhas bem limpinhas, para não estragar o gosto do leite. Chegando mais perto pude observar que na verdade eram rolos de feno, cobertos com uma lona apropriada de cor branca. A propósito, vaca em holandês escreve-se KOE, mas a pronuncia é daquele jeito, vocês sabem qual.
Escolher a Holanda como nossa porta de entrada para a Europa foi uma decisão acertada. Poder apreciar a riqueza do seu acervo cultural, a beleza das suas edificações, usufruir do seu transporte público, transitar pelas suas ruas e canais, conhecer suas cidades históricas e sua moderna infra-estrutura nos trás uma gama imensa de percepções que palavras são insuficientes para descrever e apenas o contato direto pode proporcionar. Da mesma maneira que os elementos físicos, a educação dos neerlandeses também nos proporcionou experiências interessantes. Durante nossa visita a Amsterdã, paramos na beira de um canal para comer um lanche quando, de repente, se aproximou de nós um homem mal trajado, com a cara de quem tinha tomado uns goles. A bem da verdade, sua aparência não correspondia ao modelo de alguém muito ajustado à sociedade. Se fosse aqui no Brasil qualquer um pensaria que ele iria pedir dinheiro ou iria ficar conversando besteiras, mas não foi o que se sucedeu. O sujeito havia encontrado próximo de onde estávamos um isqueiro velho, largado no chão. O homem pegou o isqueiro e foi perguntando a todas as pessoas que estavam naquele lugar se alguém era dono daquele objeto. Somente após se certificar que este não pertencia a nenhum dos presentes, anunciou então, em voz alta, que iria ficar com ele. Só então, botou o isqueiro no bolso e foi embora.
Pode parecer coincidência, mas desde que era menino, eu sonhava em conhecer a Holanda. Um pouco por conta de um antepassado, mas principalmente por causa da figura da Irmã Letícia, diretora e fundadora da minha primeira escola. Contar os eventos pitorescos dessa visita é apenas o jeito deste simples caeté compartilhar com vocês a maravilhosa experiência que tive oportunidade de usufruir. Aproveitando a oportunidade, gostaria de desejar a todos uma ótima semana e prometo no próximo contato continuar contando as aventuras de um caeté nas terras de além mar.
Saúde, luz e paz
Virgílio Agra
(Escrito em
13/08/2011)
PS: No
decorrer da viagem, várias vezes associávamos os lugares que víamos ou as
situações que vivenciávamos a algumas músicas do nosso pop rock brasileiro. Uma
delas foi a música Ciúme, de Roger Moreira, aqui tocada numa versão acústica pela
inesquecível banda Ultraje a Rigor.
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