terça-feira, 30 de julho de 2013

E os meus caminhos me levaram a Roma


Na Basílica de São Pedro

Colegas de todos os caminhos

Será que todos os caminhos levam a Roma? Não sei se "todos", mas o meu percurso no velho continente passou por lá.

Chegamos a Roma numa manhã de muito sol prenunciando qual seria o clima da nossa estada na terra dos Césares. Pegamos um ônibus no aeroporto de Ciampino até a estação Termini, no centro da cidade, de onde fomos caminhando até a nossa pousada, localizada estrategicamente para facilitar nossos deslocamentos.

Após nos alojarmos demos uma volta na vizinhança onde descobrimos uma pizzaria simples, porém muito acolhedora, de propriedade de um egípcio chamado Mohamed. Após recarregarmos as baterias, de posse de um mapa e dicas dadas pelo pessoal da pousada, fomos "bater perna" pelas ruas de Roma. Caminhar pelas ruas de uma cidade tão antiga já é em si um grande atrativo turístico, mas nós não poderíamos deixar de aproveitar a oportunidade para visitarmos algumas igrejas que, com certeza, teriam muito a enriquecer o passeio. O problema é que, por conta do calor, minha esposa e uma das filhas resolveram usar shorts e camiseta, trajes pouco adequados à visita a um templo. Elas só não ficaram do lado de fora porque os padres, cansados dos problemas que a limitação ao acesso provocava, passaram a disponibilizar peças de tecido que os visitantes usavam para cobrir pernas e ombros. Resolvido o problema, após uma tarde de muita caminhada, fotos, comentários e todo o ritual próprio de quem descobre um novo mundo, pegamos um metrô e fomos visitar a mais famosa fonte de Roma.

Aqui no Brasil nos acostumamos a não confiar na água fornecida pelas empresas de abastecimento nacionais, um costume por demais interessante para as empresas que comercializam as águas minerais. Na Europa, pelo contrário, a água da torneira é sempre de boa qualidade e comprar água engarrafada pode satisfazer um hábito tupiniquim, mas não é nada racional. Ao longo de toda a viagem nunca nos separamos das nossas garrafinhas que eram regularmente abastecidas nas fontes, pousadas e mesmos nas torneiras dos bares, lanchonetes e restaurantes onde nos alimentamos. Naturalmente, algumas fontes não têm água adequada ao consumo, mas a potabilidade da água, ou não, encontra-se normalmente sinalizada. A Fontana di Trevi é um desses exemplos de fonte cuja água, atualmente, não deve ser consumida. No passado, no entanto, era lá onde jorrava água de boa qualidade trazida por um aqueduto romano desde antes da era cristã. No século XVIII foi construído um monumento para decorar a fonte que transformou o local num dos pontos mais charmosos da cidade. O local é simplesmente lindo, mas a "mundiça" de gente é tão grande que termina por prejudicar a beleza do local. Para completar, espalharam o boato que aquele que fica de costas para a fonte, faz um pedido e joga uma moeda na água por sobre a cabeça tem o sonho realizado. O resultado é que em redor da fonte fica um monte de gente besta jogando moeda na água como se esse gesto fosse resolver os problemas do mundo.

No dia seguinte pegamos um metrô próximo da pousada e fomos caminhar nas ruínas do Palatino, Fórum Romano e Coliseu. Tentar descrever tudo que foi visto ou apreendido na visita àquele parque arqueológico geraria um texto tão longo que se tornaria enfadonho, mas teve umas coisinhas que eu não sabia e que me chamaram a atenção. Enquanto os templos e grandes monumentos eram construídos de pedra, conforme consta nas fotos dos livros de história, pude observar que as residências eram construídas em alvenaria. As paredes eram construídas como se fosse um sanduíche, sendo a parte externa construída de tijolo e o miolo era preenchido com uma argamassa misturada com pedras ou pedaços de tijolos, a exemplo de como é, nos dias de hoje, uma argamassa de concreto. Ao atingir a altura desejada, as paredes eram unidas por arcos podendo a parte de cima ser também preenchida com aquela argamassa, formando uma laje que poderia servir de base para a construção de um novo andar. O fato é que pude observar que esta técnica permitia a construção de edificações muito altas, o que equivaleria, com a tecnologia de hoje, a prédios de vários andares.

O nosso último dia em Roma foi escolhido para nossa visita ao Vaticano. Acreditávamos que, por ser uma segunda-feira, haveria menos gente nas filas para a entrada do museu... ledo engano. Pegamos o metrô bem cedo e quando chegamos ao local a fila já estava dobrando a esquina, mas, apesar de longa, caminhou relativamente rápida. Na compra dos ingressos fiquei surpreso quando o atendente, literalmente, jogou os bilhetes sobre o balcão. Vocês sabem aquele jeito que jogador de baralho faz quando joga sobre a mesa aquela cartada que encerra a partida? Só faltou o cara gritar:

 - BATI.

Paguei a quantia e peguei os ingressos meio desconfiado. Pensando, o que teria acontecido para o rapaz proceder daquela maneira? Felizmente, após observar melhor outras pessoas e outros lugares, percebi ser um jeito italiano sem nenhuma maldade, apenas diferente daquilo ao qual eu estou acostumado.

Já tinha ouvido falar que no Vaticano tinha muito ouro, metais e pedras preciosas. Confesso que não foi exatamente isso o que vi. Pude apreciar muitas obras de arte que, pelas suas qualidades, são de valor inestimável, mas na sua grande maioria eram pinturas nas paredes e tetos, retratando passagens bíblicas, elaboradas por grandes mestres das artes. Mas uma característica do museu fez com que eu me sentisse no carnaval de Salvador. A quantidade de gente era tão grande que se o cabra levantasse o pé do chão, iria até o final da galeria num pé só.

Ao sairmos do museu demos a volta no quarteirão que compõe o Vaticano e fomos à Basílica de São Pedro. Como em outras igrejas de interesse histórico e artístico, havia peças de tecidos para cobrir as pernas e ombros desnudos dos desavisados, só que dessa vez a minha turma estava prevenida. O curioso é que, apesar da limitação à exposição do corpo em carne e osso, quando se tratava de nudez em mármore a tolerância era bem maior, eis que a basílica era decorada com várias esculturas com figuras femininas com os seios nus. Falando em escultura, além da Peitá, de Michelângelo, obra maravilhosa que dispensa comentários, havia uma estátua de São Pedro em condições bastante interessantes. Produzida em mármore no século XIII, ao longo do tempo peregrinos beijaram e afagaram tanto os pés do santo que terminaram desgastando os dedos do coitadinho. Resultado, São Pedro tá lá, sentadinho, só com os cotocos de pés, sem um dedo sequer.

Roma é, sem dúvida nenhuma, uma cidade única. Com sua história milenar, proporciona aos seus visitantes tanto o contato com o que existe de melhor na história, na arte e na cultura, como também com problemas tão frequentes nas grandes cidades. Diferentemente das terras batavas, plana e cheia de bicicletas, a Cidade Eterna é situada em terreno ondulado. Este fator, aliado a uma população de quase três vezes a de Amsterdã, influencia fortemente no trânsito da cidade onde chama a atenção a grande quantidade de motonetas e mini carros. Enquanto na Holanda os ônibus passam nos pontos em horários precisos a realidade romana não foge àquilo que temos no transporte público deste grande país. Os ônibus atrasam, vêm lotados e têm um sistema de tarifação que acredito, propicia uma severa evasão de receita. Foi lá onde mais caminhamos e foi de lá que partimos num trem excelente a mais de 230 quilômetros por hora. Não sei se todos os caminhos levam a Roma, mas achei bom que os meus passaram por lá.

Caros colegas, ao mesmo tempo em que desejo a vocês uma boa semana, espero que o criador ilumine o caminho de todos.

Saúde, luz e paz

Virgílio Agra

(Escrito em 20/09/2011)


PS: Comparando a cultura e o desenvolvimento que encontramos no Velho Continente com a realidade deste grande país, mas também verificando a transitoriedade dos antigos impérios que um dia foram dominante e em outro foram destruídos, segue aqui a música “Inútil”, de Roger Moreira, com a Banda Ultraje a Rigor.


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