terça-feira, 16 de agosto de 2011

Candidato bom de rádio, bom de voto


Escrito em (06/10/2008)

Colegas de todas as legendas.

Durante as últimas eleições fui destacado pela Justiça Eleitoral, para realizar um trabalho numa cidade do interior lá no sertão alagoano. Apesar das perspectivas sombrias, acerca do clima eleitoral naquele município, nada encontrei que não fosse o esperado em uma cidade qualquer durante um evento deste tipo e pude realizar meu trabalho sem maiores preocupações. Enquanto observava as pessoas e ouvia as conversas e especulações sobre o resultado do pleito, me veio à lembrança um velho amigo que há tempos não vejo.

Arnaldo Ferreira Gomes era vendedor na loja de meu pai, lá nas bandas de Paulo Afonso, no sertão da Bahia. Arnaldo começou a trabalhar na loja muito jovem, quase um menino. Começou realizando serviços auxiliares no depósito e em pouco tempo estava com uma caneta e um talão realizando vendas atrás do balcão. Naquele tempo, quando não existiam os modernos sistemas de auto-atendimento, tele-marketing nem vendas on-line, quem trabalhava com vendas ou era caixeiro viajante ou era balconista. Sobrou para Arnaldo este último título. No começo ele era magrinho, mas com o passar do tempo e com a relativa ascensão profissional, conseguiu acumular alguns pesos a mais, de modo que alguns colegas também o chamavam de “Gordo”.

Confesso a vocês que, em toda a minha vida, não conheci até hoje um sujeito tão espirituoso quanto ele. Dotado de grande inteligência, até hoje eu me divirto lembrando as suas astúcias. Evangélico, fiel praticante dos seus preceitos religiosos, conseguia tirar onda com a cara de qualquer um, sem jamais fazer uso de palavrões ou qualquer termo que pudesse ser taxado de baixo calão. Com seu jeito habilidoso de falar, sabia conduzir um diálogo para o ponto em que soltava a piada certa com a cara do sujeito. A coisa era tão bem conduzida que até a “vítima” da vez achava engraçado. O ambiente de trabalho com ele ficava tão leve e divertido que quando ele tirava férias, os clientes reclamavam da sua ausência.

Se eu me atrevesse a relatar todas as brincadeiras que ele tirou ao longo do tempo em que trabalhou no balcão do Ferrageiro, com certeza daria para escrever um livro de grossas dimensões. Como costumamos dizer aqui no nordeste, ele fazia “resenha” com todo mundo, mas com aqueles que tinham pretensões políticas, sua habilidade chegava à beira da perfeição.

Certa vez, conversando com um cliente que externara sua vontade de se candidatar a vereador numa cidade vizinha, Arnaldo começou a falar que já tinha ouvido várias vezes o nome dele na rádio. Ouvindo um comentário daqueles o cabra se interessou pela conversa. Começou a falar sobre seu potencial eleitoral, sobre “serviços prestados” à comunidade e coisa e tal. O Gordo por sua vez foi alimentando a conversa e vez por outra dizia:

- A rádio só fala seu nome.

A conversa continuou, algumas pessoas que ouviram começaram fazer perguntas e Arnaldo de vez em quando olhava para o sujeito e dizia:

- A rádio só fala seu nome.

Lá para as tantas, depois de ouvir várias vezes as palavras de Arnaldo o pré-candidato não se agüentou de curiosidade e perguntou.

- Que rádio?

E a resposta foi imediata

- A Rádio Patrulha.

Aí, então, todo mundo caiu na risada.

Em outra ocasião, desta vez após uma eleição, um cliente começou a comentar a derrota sofrida por um parente no último pleito. Arnaldo aproximou-se, ouviu a conversa e, em dado momento, fez uma cara de repreensão e disse:

- Durante a eleição eu disse a ele que tinha mais de 20 votos e ele não quis de jeito nenhum.

Ouvindo aquilo o homem ficou indignado. Como é que um candidato tem a capacidade de recusar 20 votos? Numa eleição municipal é um peso considerável. Olhando para o Gordo perguntou:

- Mas ele não quis por quê?

- Porque eram todos votos contra.

Eu não preciso dizer a reação dos que estavam em redor.

Colegas de todas as legendas, sublegendas, facções e tendências, enquanto algumas pessoas que respondem a processos criminais, algumas delas residindo no xilindró, são eleitas em várias partes deste grande país, pelo menos a sagacidade de pessoas como meu amigo Arnaldo nos transmite alegria e nos ajuda a enfrentar com melhor humor as dificuldades de mais uma semana que se inicia.

A todos muita saúde e paz

Virgílio Agra

PS: A política brasileira é tão fértil em situações cômicas, as vezes trágicas, que quando eu ouço falar nesse assunto só me lembro da história de um matuto que recebeu convite para ser candidato, contada pelo arquiteto por formação, comediante por vocação e paraibano de nascimento, Jessier Quirino.


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