Graff Zeppelin
no Campo do Jiquiá, Recife - PE
(escrito em 16/08/2009)
Colegas de todos os círculos de
amizades.
Diga-me quem tu conheces e eu te direi quem tu és.
Um dia, conversando com meu pai, ele me falou da ocasião em que viu nos céus um Zeppelin. O fato ocorreu durante uma viagem que ele fazia de carro de boi, entre o Sítio Caburé, onde morava com meus avós, e o povoado de Capelinha, a terra da minha avó, lá na beira do Rio Ipanema, no sertão alagoano. Disse-me que todos pararam para ver aquela maravilha no céu e, apesar de ser muito criança à época, tinha em torno de quatro anos de idade, falou-me da admiração que a passagem do dirigível provocara em todos. Eu fico imaginando o contraste, enquanto na terra uma família viajava num dos mais antigos meios de transporte, no céu passava o que havia de mais moderno em transporte de passageiros.
A era dos balões dirigíveis foi curta, mas a impressão que aquelas geringonças provocaram no povo do sertão mexeu com o imaginário daquela gente durante muitos anos. O fascínio provocado foi tamanho que durante muitos anos a palavra Zeppelin significava para o sertanejo uma coisa bonita, uma coisa grandiosa. Reflexo disto é que, até no cangaço, havia um cangaceiro que recebeu a alcunha de Zepelim.
Os anos passaram, meu pai tornou-se um adulto e o Brasil passou a viver a época em que as antigas estradas usadas pelos carros de bois começavam a ser melhoradas ou substituídas pelas estradas de rodagem, vias adequadas ao uso dos automóveis. Para construí-las o governo primeiro criou o DNOCS, que tinha a atribuição de promover e executar todas as obras na região semi-árida do nordeste. Posteriormente, foi criado o DNER, que o sertanejo chamava de "Dê-Nê-Erre", com a atribuição específica nas obras rodoviárias. Em Santana do Ipanema foi constituída uma Residência do órgão para coordenar a construção e manutenção das estradas de rodagem no sertão alagoano. O quadro funcional da Residência do DNER tinha na sua composição desde um engenheiro, passando por funcionários administrativos, motoristas e mecânicos, até serventes que faziam os serviços gerais da unidade. Dentre estes últimos servidores havia um senhor chamado Severino.
Eu não consegui saber a cidade de origem de Seu Severino, soube apenas que era sertanejo, mas de outro estado, e que fixara residência em Santana do Ipanema por conta do emprego conseguido. Descobri que ele gostava muito de caçar e, como todo caçador, perdia o amigo, mas não perdia a história e, consequentemente, apesar da baixa escolaridade, tudo aquilo que ouvia, tinha algo a dizer sobre o assunto.
Nos tempos em que rádio era um luxo e televisão uma peça de ficção, os homens das cidades do interior costumavam encontrar-se todas as noites em uma praça da cidade para conversar, saber e comentar as últimas notícias, boatos e similares. Esses pontos de encontro eram chamados de "Senadinhos" e eu lembro-me que meu pai não perdia uma só das suas sessões. Esses "fóruns de discussão" eram bastante democráticos, participando deles pessoas das diversas classes e ofícios, e Seu Severino era também um dos seus frequentadores contumazes.
Certa noite, entre um assunto e outro, alguém se dirigiu para Seu Severino e perguntou:
- Severino? Você conheceu o Zeppelin?
Seu Severino admitir que não soubesse ou nunca tinha ouvido falar de algo era uma parada que ele não podia admitir. Olhou sério para o seu interlocutor e sem titubear disse:
- "Ói", o "Zé Pelim mermo" eu "num" conheci não, mas o "Ontonho Pelim, Pêdo Pelim, Chico Pelim"... Conheci todos eles muito bem.
A resposta teve tamanha repercussão que, desde aquele dia, até os dias de hoje, mesmo após a sua morte, o seu autor é lembrado como Severino Zeppelin.
Esse negócio de conhecer pessoas é realmente interessante. Vocês não vão acreditar o que aconteceu comigo esta semana. Encontrei com uns velhos amigos de infância e, enquanto tomávamos uma "meiota de cana" num bar da esquina, conversamos sobre os mais diversos assuntos. Sabendo que um dos membros daquele "Senadinho" era escritor, com vários livros publicados e membro da ABL, criei coragem e perguntei:
- Ô Bigode? Você conheceu o Rodrigo Cruz?
Ele, que já tinha tomado umas quatro doses de Azuladinha, olhou para mim e com uma segurança de fazer inveja, respondeu:
- Olhe... Hic, o Rodrigo Cruz, que por sinal é meu afilhado de casamento... Hic, eu não conheci não, mas o Osvaldo Cruz, Souza Cruz e Cruz Credo.... Conheci todos eles muito bem... Hic.
Aproveitando a oportunidade para desejar a todos uma ótima semana de trabalho, despeço-me citando um velho provérbio do sertão nordestino:
"Boi se pega pelo chifre e homem pela palavra".
Saúde e paz.
Virgílio Agra.
Diga-me quem tu conheces e eu te direi quem tu és.
Um dia, conversando com meu pai, ele me falou da ocasião em que viu nos céus um Zeppelin. O fato ocorreu durante uma viagem que ele fazia de carro de boi, entre o Sítio Caburé, onde morava com meus avós, e o povoado de Capelinha, a terra da minha avó, lá na beira do Rio Ipanema, no sertão alagoano. Disse-me que todos pararam para ver aquela maravilha no céu e, apesar de ser muito criança à época, tinha em torno de quatro anos de idade, falou-me da admiração que a passagem do dirigível provocara em todos. Eu fico imaginando o contraste, enquanto na terra uma família viajava num dos mais antigos meios de transporte, no céu passava o que havia de mais moderno em transporte de passageiros.
A era dos balões dirigíveis foi curta, mas a impressão que aquelas geringonças provocaram no povo do sertão mexeu com o imaginário daquela gente durante muitos anos. O fascínio provocado foi tamanho que durante muitos anos a palavra Zeppelin significava para o sertanejo uma coisa bonita, uma coisa grandiosa. Reflexo disto é que, até no cangaço, havia um cangaceiro que recebeu a alcunha de Zepelim.
Os anos passaram, meu pai tornou-se um adulto e o Brasil passou a viver a época em que as antigas estradas usadas pelos carros de bois começavam a ser melhoradas ou substituídas pelas estradas de rodagem, vias adequadas ao uso dos automóveis. Para construí-las o governo primeiro criou o DNOCS, que tinha a atribuição de promover e executar todas as obras na região semi-árida do nordeste. Posteriormente, foi criado o DNER, que o sertanejo chamava de "Dê-Nê-Erre", com a atribuição específica nas obras rodoviárias. Em Santana do Ipanema foi constituída uma Residência do órgão para coordenar a construção e manutenção das estradas de rodagem no sertão alagoano. O quadro funcional da Residência do DNER tinha na sua composição desde um engenheiro, passando por funcionários administrativos, motoristas e mecânicos, até serventes que faziam os serviços gerais da unidade. Dentre estes últimos servidores havia um senhor chamado Severino.
Eu não consegui saber a cidade de origem de Seu Severino, soube apenas que era sertanejo, mas de outro estado, e que fixara residência em Santana do Ipanema por conta do emprego conseguido. Descobri que ele gostava muito de caçar e, como todo caçador, perdia o amigo, mas não perdia a história e, consequentemente, apesar da baixa escolaridade, tudo aquilo que ouvia, tinha algo a dizer sobre o assunto.
Nos tempos em que rádio era um luxo e televisão uma peça de ficção, os homens das cidades do interior costumavam encontrar-se todas as noites em uma praça da cidade para conversar, saber e comentar as últimas notícias, boatos e similares. Esses pontos de encontro eram chamados de "Senadinhos" e eu lembro-me que meu pai não perdia uma só das suas sessões. Esses "fóruns de discussão" eram bastante democráticos, participando deles pessoas das diversas classes e ofícios, e Seu Severino era também um dos seus frequentadores contumazes.
Certa noite, entre um assunto e outro, alguém se dirigiu para Seu Severino e perguntou:
- Severino? Você conheceu o Zeppelin?
Seu Severino admitir que não soubesse ou nunca tinha ouvido falar de algo era uma parada que ele não podia admitir. Olhou sério para o seu interlocutor e sem titubear disse:
- "Ói", o "Zé Pelim mermo" eu "num" conheci não, mas o "Ontonho Pelim, Pêdo Pelim, Chico Pelim"... Conheci todos eles muito bem.
A resposta teve tamanha repercussão que, desde aquele dia, até os dias de hoje, mesmo após a sua morte, o seu autor é lembrado como Severino Zeppelin.
Esse negócio de conhecer pessoas é realmente interessante. Vocês não vão acreditar o que aconteceu comigo esta semana. Encontrei com uns velhos amigos de infância e, enquanto tomávamos uma "meiota de cana" num bar da esquina, conversamos sobre os mais diversos assuntos. Sabendo que um dos membros daquele "Senadinho" era escritor, com vários livros publicados e membro da ABL, criei coragem e perguntei:
- Ô Bigode? Você conheceu o Rodrigo Cruz?
Ele, que já tinha tomado umas quatro doses de Azuladinha, olhou para mim e com uma segurança de fazer inveja, respondeu:
- Olhe... Hic, o Rodrigo Cruz, que por sinal é meu afilhado de casamento... Hic, eu não conheci não, mas o Osvaldo Cruz, Souza Cruz e Cruz Credo.... Conheci todos eles muito bem... Hic.
Aproveitando a oportunidade para desejar a todos uma ótima semana de trabalho, despeço-me citando um velho provérbio do sertão nordestino:
"Boi se pega pelo chifre e homem pela palavra".
Saúde e paz.
Virgílio Agra.