segunda-feira, 16 de abril de 2012

Nem todo sapato é calçado


(Escrito em 26/07/2009)
Colegas de todos os aumentativos e diminutivos!
Qual é o diminutivo de texto?

A riqueza do nosso idioma, ao mesmo tempo em que nos encanta também nos prega algumas peças. Num país grande como o nosso, de acordo com a região, idade, escolaridade e até mesmo de acordo com o meio de convivência de cada um, as palavras passam a ter os mais diversos sentidos.


Foi me lembrando dessas particularidades linguísticas que veio a minha memória uma das minhas tias. Dentre todas elas, Tia Rosa sempre teve um comportamento bastante singular. Mulher de opinião firme, nunca foi do tipo que abre mão de suas convicções simplesmente para agradar alguém. Bastante trabalhadora, mesmo sentindo o peso da idade avançada, trabalha até hoje na farmácia junto ao marido, meu Tio Alberto. Sempre foi uma pessoa muito prestativa, não medindo esforços para ajudar quem dela precisasse. No sertão de Alagoas, na época em que os médicos eram raros e um hospital era peça de ficção, conta minha mãe, que era Tia Rosa quem cuidava dela quando adoecia. Mãe de nove filhos sempre foi rigorosa na educação dos mesmos, mas, como toda mãe zelosa, era também uma ferrenha defensora das suas crias.
Como toda e qualquer pessoa, Tia Rosa tinha seus hábitos de falar que até hoje, muito provavelmente, mantém. Alguns deles ficaram gravados na minha memória, como, por exemplo, quando éramos criança e porventura não nos comportávamos de maneira adequada à mesa ela dizia logo:
- Tenha estilo!
Fazendo assim referência ao devido uso da boa educação.
Quando a gente falava alto ela perguntava logo:
- Parece que você está nas brenhas?
Falava assim, fazendo uma alusão às pessoas que viviam no mato e que tinham que falar aos gritos, por causa das distâncias. Mas, talvez, a maior pérola do seu falar era o hábito de chamar igualmente todos os tipos e tamanhos de sapatos, sandálias, chinelos, alpercatas, tamancos e similares simplesmente como pelo termo de calçado.
Eis que há uns vinte anos atrás, chegou aos ouvidos de Tia Rosa um boato que uma amiga dela estaria espalhando que uma de suas filhas era "sapatão". Apesar do seu reconhecido recato diante do uso de certas palavras, ela, como o restante deste grande país, sabia muito bem o significado daquele termo e resolveu colocar o assunto em pratos limpos. Ninguém iria denegrir a imagem de uma filha sua sem que ela prontamente a defendesse. Assim sendo, procurou a suposta caluniadora e não contou conversa, foi direto ao assunto: - Me diga uma coisa? É verdade que você anda espalhando por aí que minha filha é "calçadão"?
É certo que, diante da inesperada pergunta, Tia Rosa teve que primeiro explicar o que ela queria saber, para que em seguida tudo ficasse esclarecido, tanto com relação à notícia, quanto à suposta autoria. Felizmente tudo foi devidamente esclarecido, preservando-se assim uma velha amizade.

Como parte da minha programação de férias, ao voltar dos Passos de Anchieta, no Espírito Santo, dei uma esticadinha até a Cidade Maravilhosa. Pude rever os meus colegas de trabalho, o que foi para mim um imenso prazer. Mas, como não poderia deixar de ser, aproveitei a noite para rever os bares do Rio, uma atração à parte daquela cidade maravilhosa. Então, lá estava eu, minha esposa Eliane, Penha, Leandro, Gaucho e também Marcelo Leite. Tomamos uma rodada de chope na Lapa, acompanhada de um monte de conversa jogada fora, outra rodada no Amarelinho da Cinelândia, mais outro monte de conversas fiadas e brincadeiras e assim se fez nossa noitada que com certeza será lembrada na posteridade.


Noutro dia, tivemos o prazer de fazer um verdadeiro city tour pela mais bela paisagem urbana do mundo, tendo como nossos anfitriões os caetés honorários Ivan Varella e sua esposa Juçara, com direito a apreciar o céu da praia de São Conrado colorida por uma dezena de parapentes. Foi um belo passeio sem dúvida nenhuma, lamento apenas que não pude rever os “sapatões”, digo, os calçadões de Copacabana.


Gostaria de agradecer a receptividade que tive na Cidade Maravilhosa, bem como em Vila Velha - ES, mas, a propósito do convite da caeté honorária Graça Uchoa, para participar da corrida Garoto agradeço muito, mas, infelizmente, não participarei deste evento, pois ouvi dizer que o fantasma de um famoso pop star já garantiu presença na "corrida ao garoto" e eu tenho muito medo de assombração. Huuhuuhuuhuu....


Pois bem caros colegas, e mais uma vez, enviando para vocês um dos meus textículos, me despeço desejando uma boa semana de trabalho a todos.


Saúde e paz


Virgílio Agra.


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domingo, 1 de abril de 2012

Um caeté nos Passos de Anchieta


(escrito em 16/07/2009)

Colegas de todos os labores.

Como vocês, eu também não sou de ferro e, graças a Deus, estou em gozo de férias, algo que não tive o prazer de usufruir desde janeiro de 2004. Logo, enquanto vocês estão aí no exercício das suas atividades corriqueiras, eu aproveito este esperado momento para andar pelo mundo. Andar a pé, de carro, de avião... Andar para ver ou rever parentes, amigos, lugares e também para realizar antigos projetos.

Falando em projetos antigos... Antigamente, no tempo em que o naturismo era prática corriqueira nas praias brasileiras, o Padre José de Anchieta cansou da garoa paulista e, descendo a serra, foi viver no litoral. Foram muitas idas e vindas, até que ele resolveu montar uma missão num ponto do litoral da capitania do Espírito Santo chamado de Rerigtiba. A missão ficava a uma distância de aproximadamente 100 quilômetros de Vitória. Como naquele tempo não havia linhas de ônibus naquelas bandas, o padre se acostumou a ir de Vitória a Rerigtiba a pé, e fazia isso tantas vezes e tão rápido que, segundo fontes fidedignas, já tinha índio que chamava a ele de fuxico, de tanto que ele andava. O apelido só não pegou porque Anchieta, apesar de andar descalço, bateu as botas numa das suas estadas na missão. A verdade é que os nativos gostavam do "homi" e como última homenagem resolveram levar o defunto nas costas até Vitória, sendo esta sua última caminhada.

O tempo passou e na última década do século passado, alguns descendentes do processo colonial-miscigenador resolveram refazer o caminho percorrido pelo jesuíta entre a cidade de Vitória e a antiga Rerigtiba, hoje cidade de Anchieta. A idéia atraiu outras pessoas até que, em 2009, na 12ª edição dos Passos de Anchieta, este humilde caeté juntou-se a outros 4.000 malucos e passou 4 dias caminhando, refazendo esta trilha histórica.

Na manhã do dia 11 de junho, tendo como ponto de partida a catedral metropolitana de Vitória, iniciamos a jornada. Como companheiro de viagem, contei com o primo e caeté honorário Paulo Uchôa, um veterano dos Passos. Descemos a escadaria em frente ao Palácio Anchieta, sede do governo capixaba, e seguimos pela avenida que margeia a baía de Vitória em direção ao histórico Convento da Penha em Vila Velha. Continuando, percorremos o calçadão da orla marítima em direção à Barra do Jucu (ô rima esquisita!).

A organização do evento colocava ao longo do percurso vários pontos de apoio, denominados de oásis, onde era servida água e frutas para os andarilhos. Fazia um sol de rachar, as pernas começaram a doer e os pés esquentaram como eu nunca havia sentido antes. Num dos oásis uma alma caridosa entregava aos participantes um sachê de protetor solar e outro de relaxante muscular. O meu pescoço ardia por causa do sol e eu prontamente resolvi passar o protetor solar, ao esfregar o produto no pescoço comecei a sentir um cheirinho de cânfora, aí resolvi conferir a embalagem do produto e qual não foi minha surpresa, eu havia colocado o protetor solar no bolso e havia esfregado o relaxante no pescoço que ficou bem ardido, mas pelo menos ficou cheiroso.

Quando chegamos à Barra do Jucu a Banda de Congo Mestre Honório se apresentava saudando os caminhantes, mas eu confesso que não pude apreciar a coisa muito bem, porque minhas pernas doíam tanto que eu só pensava como seria o dia seguinte. Mas, para minha tranquilidade, após uma boa noite de sono amanheci novinho em folha e pronto para a próxima etapa.

O segundo dia, entre a Barra do Jucu e a praia de Setiba, foi o de percurso mais longo, 28 quilômetros. Nele o andarilho caminha pela areia de praias desertas e estas são tão longas que a vista não alcança o seu final, sendo um bom teste para a sua força de vontade.

No terceiro dia, entre Setiba e Meaípe, enfrentamos chuva durante toda a manhã e um probleminha que o padre Anchieta não tinha naquele tempo. A organização do evento teve que pedir permissão de passagem a uma série de condomínios que privatizaram uma sequência de praias. Apesar de ser um trecho muito bonito, tivemos que caminhar sob os olhos de zelosos seguranças que tinham como missão garantir que ninguém tentasse um desvio na rota. O pior, no entanto, estava por vir. Paulo me contou que em Meaípe havia um delicioso bolinho feito com massa de aipim, que eu conheço como macaxeira, recheado e frito no óleo. Após a longa caminhada eu não pensava em outra coisa, exceto provar do tão decantado bolo. O danado do bolo realmente era muito bom, o problema é que o óleo da fritura causou um verdadeiro estrago, me obrigando a passar a noite caminhando da cama para o banheiro e vice e versa.

O último dia, entre Meaípe e Anchieta, foi o mais curto e o mais descontraído. Eu e Paulo fizemos amizade com outros andarilhos e entre causos e piadas chegamos, após subir uma escadaria, à Igreja Matriz de Anchieta onde a comunidade aplaudia cada um dos andarilhos que chegava. Neste dia conheci uma senhora, perguntei sua idade e ela me respondeu ter setenta anos. Continuando a conversa ela me contou ser aquela a sexta vez que participava dos Passos e que o seu filho, preocupado com sua saúde, havia dito que ela não iria participar daquele evento nem amarrada. Decidida, ela não pensou duas vezes, saiu de casa dizendo que iria para a casa de uma irmã e estava lá, caminhando alegre e satisfeita. Finalizando ela ainda me disse rindo.

- Ele nem sabe onde eu estou agora.

Uma coisa que muito me impressionou, foi a receptividade que tivemos ao longo de todo o trajeto por parte das diversas comunidades. Em Vila Velha uma família tradicionalmente oferece um café da manhã aos andarilhos. Em Ponta da Fruta a comunidade disponibilizava uma mesa com café, leite, pães, bolos e biscoitos, servindo a todos com muito boa vontade. Em alguns lugares grupos folclóricos se apresentavam para nós, em outros recebemos souvenires e até tapetes vermelhos eram colocados para nos saudar. A receptividade era tamanha que em Ubu e em Anchieta moradores nos convidaram para tomar uma dose de cachaça com direito a um tira-gosto e como eu não queria ser grosseiro... Aceitei, né?

A participação nos Passos de Anchieta foi a concretização de um velho sonho, mas, com toda sinceridade, venho aqui não apenas para contar a vocês uma parte das minhas férias, mas, principalmente, para fazer uma justa homenagem a um dos estados mais bonitos do Brasil e ao povo espírito-santense, um povo simpático, acolhedor e com certeza muito corajoso, porque para carregar um defunto nas costas por cem quilômetros e ainda ter uma bandeira cor-de-rosa é preciso ter muita coragem.

Aproveitando também, gostaria de apresentar o meu profundo respeito ao Sr. Virgílio Ribeiro, que apesar dos seus 87 anos cumpriu todo o percurso com uma disposição de fazer inveja a muita gente. "Cabra bom!". Também, com um nome desses?

Caros colegas, ao mesmo tempo em que quero desejar a todos um bom final de semana gostaria de perguntar:

- Na certidão de óbito de Michel Jackson o campo destinado à cor do falecido foi preenchido com "Black or white"?

Saúde e paz

Virgílio Agra

PS: Da minha participação nos Passos de Anchieta trouxe um monte fotos e um CD, presente de uma prima, com músicas de congo. A combinação dos dois gerou um pequeno vídeo.

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